[Entrevistas] Deus no Gibi entrevista Amaro Braga
DEUS NO GIBI - ENTREVISTA
Por Fernando Passarelli
Versão original: acesse: http://www.deusnogibi.com.br/entrevistas/amaro-braga/
Se o Amaro Xavier Braga fosse um super-herói, ele seria daqueles que podem acessar vários poderes, tamanha a diversidade de sua formação acadêmica. É doutor em Sociologia, especialista em Ensino de História das Artes e das Religiões, em Artes Visuais e Gestão de Educação à Distância, e tem um grande envolvimento com a aplicação dos quadrinhos na educação. Não é por menos que hoje ocupa a presidência da Associação de Pesquisadores em Arte Sequencial, a ASPAS. E, pra não sair da analogia, as ASPAS é como uma “Liga das Justiça”, porque reúne uma série de outros ‘heróis’ que estudam os quadrinhos em profundidade. “Promovemos uma mudança no cenário da pesquisa acadêmica, a partir do momento que os resultados destas pesquisas são divulgados e se transformam em produtos com maior circulação em outras esferas sociais”, explica Amaro, que também é co-autor do livro “Religiosidade nas Histórias em Quadrinhos”. Nessa entrevista, ele fala sobre o trabalho da ASPAS, o uso das HQs em sala de aula e relação entre fé e produção artística.
DEUS NO GIBI – Estamos em 2017 e ainda discutimos o uso das histórias em quadrinhos como ferramenta educacional. Por que isso ainda acontece?
AMARO BRAGA – Acredito que este panorama seja fortemente influenciado pelo histórico – e estereotípico – preconceito em relação aos quadrinhos. A ênfase como objeto infanto-juvenil e entretenimento fugaz ainda prevalecem e dificultam perceber as HQs como objetos artístico-midiáticos de entretenimento com forte impacto social e representação cultural. Se as HQs são uma mídia, e o são, deve-se esperar que, como tal, tenham a possibilidade de guardar e transmitir informação, já que é isso que uma mídia faz. Sendo assim, ainda se faz necessário desenvolver estudos diversos sobre as potencialidades das HQs e seus impactos concretos na sociedade, visando uma compreensão mais ampla do que a atual. É por isso que devemos continuar a estimular o uso das HQs, não apenas no ensino básico – que já cresce com muitas iniciativas, mas também no ensino superior, o que pode auxiliar a mudança de seus status, tradicionalmente, desvalorizante.

AMARO BRAGA – A ASPAS surgiu com o intuito de reunir pesquisadores e pesquisadoras que vêm se dedicando a estudar as diversas interfaces das histórias em quadrinhos e ambientes congêneres. Ao reuni-los, fortifica e promove o desenvolvimento de novas gerações de pesquisadores, que se sentem estimulados por um cenário profissional mais acolhedor e valorizador de pesquisas. Fazendo isso, promovemos uma mudança no cenário da pesquisa acadêmica, que termina por afetar a própria maneira como as histórias em quadrinhos são vistas pela sociedade, a partir do momento que os resultados destas pesquisas são divulgados e se transformam em produtos com maior circulação e penetração em outras esferas sociais.
DEUS NO GIBI – Como tem sido a reação dos professores e educadores ao trabalho da ASPAS?
AMARO BRAGA – Tem sido bem positivo. Temos feito eventos cujas as atividades envolvem a capacitação de professores, principalmente na cidade de Leopoldina (MG), onde fica no sede, visando estimular o uso das HQs na sala de aula e a compreensão sobre a rica gama de possibilidades que se relacionam com as histórias em quadrinhos, tanto no que tange à pesquisa, quanto à produção e consumo. Também temos investido na produção e circulação de livros – fruto destas pesquisas – que estão associados a esta inserção das HQs na sala de aula.
DEUS NO GIBI – Como é possível defender, junto a esses mesmos professores, a aplicação dos quadrinhos em sala de aula quando muitos estão querendo, sim, é usar as lousas digitais, tablets e outro recursos multimídia?

DEUS NO GIBI – Ou seja: papel, ilustrações e balões de fala ainda conseguem ajudar na educação dessa geração?
AMARO BRAGA – Sim, em certa medida. Ou podem atuar na transição inter-midiática: levar este material para sua versão digital, se for o caso.
DEUS NO GIBI – Que recursos a ASPAS disponibiliza para os educadores?
AMARO BRAGA – Além dos cursos de capacitação, um banco de publicações sobre o tema e uma revista científica que recebe artigos sobre o tema.
DEUS NO GIBI – Quais são as publicações da ASPAS, até o momento, sobre pesquisa e uso de quadrinhos em sala de aula?
AMARO BRAGA – São: “Arte Sequencial em Perspectiva Multidisciplinar”, organizado por Iuri Andréas Reblin e Márcio dos Santos Rodrigues, que reúne diversos trabalhos sobre múltiplos aspectos, entre eles, a questão da sala de aula; “Religiosidade nas Histórias em Quadrinhos”, organizado por mim e Iuri Andréas Reblin, que apesar do tema específico apresenta como a linguagem das HQs vem sendo usada como instrumento pedagógico entre grupos religiosos; “O Planeta Diário: Rodas de Conversa sobre Quadrinhos, Super-heróis e Teologia”, do Iuri Andréas Reblin, enfatizando como as HQs podem ser objetos mediadores de uma compreensão teológica no ensino religioso; “As Histórias em Quadrinhos e a História: Práticas que ultrapassam fronteiras”, de Natania Nogueira, retratando sua trajetória no uso das HQs na sala de Aula. A ASPAS também foi uma grande colaboradora da coleção“Quadrinhos e Educação”, organizado pelo Thiago Modenesi e por mim, com a colaboração de quase todos os sócios. As publicações saem desde 2015, pela Faculdades dos Guararapes (PE), e estão no quarto volume: “Relatos de Experiências e Análises de Publicações” (Vol.1), “Procedimentos Didáticos” (Vol.2), “Fanzines, Espaços e Usos Pedagógicos” (Vol.3) e “Experiências Docentes, Inferências Pedagógicas e Análises de Políticas Públicas” (Vol.4). A ASPAS também foi co-editora de “Questões de Sexualidade nas Histórias em Quadrinhos”, organizado por mim, em parceria com a editora universitária EDUFAL, e de “Representação do Feminino nas Histórias em Quadrinhos”, organizado também por mim e a Valéria Fernandes da Silva. Nestes dois últimos a questão da educação sexual e de gênero se interliga com os quadrinhos. Nestes dois livros há diversos artigos sobre o uso das publicações para à educação para a diversidade, por exemplo.
DEUS NO GIBI – O que mais vem pela frente?
AMARO BRAGA – Nos próximos meses será lançado um livro meu que foi produzido numa ampla pesquisa, entre 2013 e 2015, mapeando todas as publicações de quadrinhos relacionadas as religiões no Brasil, que se chama “Religiosidade nas Histórias em Quadrinhos Brasileiras”. É um levantamento inédito que mapeia tudo que foi feito no nosso território, publicado em revista, tira, cartuns e digitais. E um dos focos importante é identificação de como as HQs foram sendo utilizadas para o ensino religioso por budistas, kardecistas, umbandistas, muçulmanos, judeus e cristãos católicos e protestantes.
DEUS NO GIBI – Qual a influência da ‘fé’ de um autor na criação e desenvolvimento dos seus personagens e narrativas em quadrinhos? O ‘criador’ (de HQ) sempre irá fazer sua ‘criatura’ (personagem/roteiro) à sua imagem e semelhança?

DEUS NO GIBI – Numa nação predominantemente católica, que passa pelo crescimento da fé evangélica neo-pentecostal, existem muitas publicações envolvendo religião?
AMARO BRAGA – É muita publicação sendo produzida de maneira ininterrupta ao longo das décadas e em todos os níveis: de tirinhas, passando por álbuns seriados de quadrinhos e outras experiências estéticas como webcomics e webtiras. Os quadrinhos cristãos superam com folga as demais esferas religiosas e o crescimento protestante e neo-pentecostal pode também ser observado nestas publicações. Praticamente todas as denominações neo-pentecostais tem publicação de quadrinhos infantil visando evangelização. A grande questão é que estas publicações não circulam em bancas de revistas, mas em ambientes próprios e por assinatura, em circulação restrita. Eu tenho feito um levantamento que visa identificar as produções explícitas que se relacionem na interface quadrinhos e religião. Já o professor Iuri Reblin tem desenvolvido pesquisas que analisam o discurso teológico em publicações de quadrinhos que não necessariamente possuem uma relação explícita com a religião. São quadrinhos comerciais, por exemplo, e, mesmo assim, possuem um discurso religioso. Mas, quando falamos em gênero de quadrinhos religiosos, eles são muitos e constantes.
DEUS NO GIBI – Por último, nos gibis, em geral, quem é Deus e qual papel ele desempenha?
AMARO BRAGA – Asim como acontece na diversidade religiosa, “Deus” nos quadrinhos assume diversas formas de acordo com os valores de quem produz a HQ. Não há uma visão absoluta e unificadora da deidade. Uma coisa é certa: ele nunca é esquecido.
Para acompanhar o trabalho da ASPAS, acesse:
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