[Banca de Mestrado] "Transformações de histórias em quadrinhos independentes no Brasil: os fluxos de informação do Instagram nas produções de HQs que “Parecem coisa do Brasil”.
Participei com muita alegria da banca (05/07/2025) de Mestrado em Ciência da Informação do PPGCI da UFAL da Dissertação "Transformações de histórias em quadrinhos independentes no Brasil: os fluxos de informação do Instagram nas produções de HQs que “Parecem coisa do Brasil”' de MARIANA PETROVANA FERREIRA DA SILVA.
O trabalho foi orientado Prof. Dr. Willian Lima Melo (PPGCI/UFAL) e participaram da Banca, alem de mim, a Profa. Dra. Priscila Muniz de Medeiros (PPGCI/UFAL).
O trabalho é uma verdadeira obra de arte, com excelente rigor metodológico, organização e apresentaação de dados. Foi um texto orgasmático. A organização da dissertação e a cadência do texto são muito boas.
Ao meu ver, supera a simples aprovação de um mestrado e ultrapassa o reconhecimento mais amplo.
Minha Análise:
Potencialidades e Contribuições do Trabalho:
1. Originalidade Temática:
• Aborda uma lacuna urgente: Enquanto estudos tradicionais focam em HQs mainstream ou análises estilísticas isoladas, esta pesquisa conecta plataformas digitais, fluxos informacionais e produção periférica, revelando como autores independentes criaram uma estética genuinamente brasileira ("Parece Coisa do Brasil").
• Dados inéditos: Analisou 140 publicações no Instagram (2018-2024), demonstrando que 78% das obras migraram de cópias de modelos estrangeiros para uma visualidade híbrida, alimentada por interações com a fanbase.
• Originalidade Temática: Aborda uma lacuna nos estudos de Ciência da Informação ao investigar interseções entre redes sociais (Instagram), fluxos informacionais e produção cultural brasileira, focando em HQs independentes. Introduz o conceito inovador de "parece coisa do Brasil" como categoria analítica para compreender transformações estéticas nas HQs, vinculado ao fenômeno Brasil Core (estética visual que estereotipa símbolos nacionais).
2. Rigor Metodológico:
◦ Combina múltiplas técnicas: análise diacrônica (trajetória das HQs impressas e digitais), análise de conteúdo (140 publicações no Instagram, 2018-2024) e observação sistemática de 4 casos empíricos (Paulo Moreira, Wesley Mercês, Helô D'Ângelo/Daniel Cesart, Kyuumangaka).
◦ Recorte temporal estratégico (2018-2024), abarcando o boom de HQs independentes via financiamento coletivo (Catarse) e impactos da pandemia.
3. Contribuições Teóricas:
◦ Demonstra como os fluxos de informação no Instagram reconfiguram paradigmas visuais, promovendo uma hibridização estética que rompe com o mimetismo de escolas estrangeiras (ex.: comics norte-americanos, mangás).
◦ Articula conceitos-chave: visualidade (como fenômeno sociocultural), apropriação social da informação (Marteleto, 2010) e dinâmicas de ubiquidade digital (Canevacci, 2018).
4. Relevância Social e Acadêmica:
◦ Dá visibilidade a autores independentes marginalizados pelo circuito editorial tradicional, destacando seu papel na construção de uma identidade visual brasileira contemporânea.
◦ Oferece base para políticas públicas de fomento à cultura digital e estudos decoloniais sobre produção midiática no Sul Global.
5. Conclusão de Mariana
- As HQs independentes brasileiras passaram de objetos miméticos para artefatos de ressignificação cultural;
- O Instagram é o núcleo gerador dessa mudança, ao converter interações em matéria-prima estética;
- O "Parece Coisa do Brasil" é um fenômeno decolonial, onde autores periféricos contestam padrões globais.
- "A rede social não é só suporte: é o espaço onde a visualidade brasileira se tornou algoritmo, meme e revolução." (p. 196)
POTENCIAL DE PUBLICAÇÃO E DISSEMINAÇÃO
Linguagem acessível, profundidade acadêmica: A dissertação transita entre análise complexa e narrativa cativante, pronta para ser transformada em livro.
"O que esta tese nos ensina é radical: nas sarjetas digitais do Instagram, nasce uma nova cartografia do Brasil, traçada não por editores, mas por artistas que transformam algoritmos em armas de reinvenção cultural."
Potenciais Aprofundamentos
1. Profundidade no Termo “visualidade” e também definir e esclarecer o que é “quadrinho independente” e sua ramificação de “webquadrinho independente”.
2. na Crítica ao "Brasil Core":
Sugere-se problematizar como a estética "parece coisa do Brasil" pode reforçar estereótipos regionais (ex.: Nordeste como lugar do atraso) ou apropriação cultural. Incluir autores como Nestor García Canclini (Culturas Híbridas) ajudaria a discutir riscos da folkcomunicação em contextos digitais.
3. Desigualdades no Acesso às Redes:
Embora mencione a "ubiquidade digital" (Canevacci), seria produtivo explorar como algoritmos do Instagram privilegiam certos corpos/territórios (ex.: eixo Sul-Sudeste) e impactam a visibilidade de autores periféricos. Dados do InternetLab sobre geografia digital no Brasil seriam úteis.
4. Diálogo com Movimentos Sociais:
Sua pesquisa poderia vincular-se a coletivos como Frente Nacional de Quadrinhos Negros ou Mulheres no Comics, examinando como coletividades organizadas ressignificam o "Brasil Core" a partir de pautas identitárias.
5. Metodologia Participante e Ética:
Como autora-quadrinista, sua inserção no campo é uma força, mas seria válido incluir um capítulo reflexivo sobre viés e posicionalidade (ex.: como sua trajetória influenciou a seleção dos casos).
6. Futuras Frentes de Pesquisa:
Estenda a análise a outras plataformas (TikTok, onde HQs animadas são tendência) e explore resistências estéticas (ex.: autores que rejeitam o "Brasil Core" por panfletarismo).
7. Sugestão Final: insira a apresentação em PowerPoint feita como se fosse uma história emq uadrinhos, como apêndice no trabalho. É estimulante par a leitura.
Em resumo….
• Pioneirismo: É o primeiro trabalho a mapear cientificamente a relação entre Instagram e HQs independentes no Brasil, tema ainda negligenciado mesmo no exterior.
• Salto qualitativo para a área: Seus conceitos (como "visualidade algorítmica") oferecem novas lentes para avaliar produções em editais de premiação.
• Diálogo com a cena real: Os casos analisados (ex.: Cuscuz Surpresa) são obras ativas e influentes – a pesquisa as legitima como patrimônio cultural, não como "subprodutos digitais".
Esta dissertação realiza uma proeza analítica ao desvendar como as histórias em quadrinhos independentes brasileiras, impulsionadas pelos fluxos informacionais do Instagram, forjam uma revolução estética decolonial. Não apenas apresenta dados, mas tece uma narrativa epistemológica sobre a transformação da cultura visual nacional. Através de um método e deixa claro qual foi (o que falta em muito trabalho), por isso, repito. Há um rigor que a pesquisa demonstra que o Instagram deixou de ser mero "suporte" para tornar-se laboratório vivo de brasilidade.
A grande contribuição reside em provar que os algoritmos da plataforma, longe de homogeneizar a produção, amplificam vozes periféricas e catalisam uma hibridização criativa. Autores como Paulo Moreira (com suas críticas sociais embebidas no Grajaú) e a dupla Kyuumangaka (ao personificar estados com humor ácido) não só rompem com o mimetismo estrangeiro, mas resignificam estereótipos em linguagem política. O conceito "Parece Coisa do Brasil" emerge, assim, como ferramenta teórica original: ele captura a síntese entre memes digitais, oralidade regional e apropriação crítica do folclore, tudo mediado pela economia dos likes e comentários.
Trata-se, portanto, de uma pesquisa que transcende a Ciência da Informação. Ao vincular fluxos digitais, decolonialidade e cultura visual, a autora oferece um modelo para entender como plataformas podem fomentar repertórios estéticos contra-hegemônicos. Seu trabalho não apenas analisa quadrinhos: arquiva a própria dinâmica da identidade brasileira no século XXI, revelando que a periferia, quando viraliza, reescreve o cânone.
Conclusão
Esta dissertação é mais que excelência acadêmica: é um manifesto sobre o futuro dos quadrinhos brasileiros. Ao provar que as redes sociais são o novo atelier da identidade visual nacional, a autora não apenas contribui para a Ciência da Informação, ela resgata a dignidade artística de milhares de criadores independentes. Publicá-la e premiá-la (no HQMIX e além, como o Pêmio CAPES de Dissertação) não é um gesto de reconhecimento: é um investimento no mapa cultural do Brasil do século XXI.
RESUMO
As Histórias em Quadrinhos figuram como objetos de pesquisa científica em diversas áreas de estudo, e, por consequência, muitos pesquisadores vêm se debruçando em discutir acerca destes artefatos gráficos, buscando entender suas múltiplas faces e aplicabilidades. Os quadrinhos não se limitam apenas ao suporte impresso, figurando também em ambientes digitais. Estas Histórias em Quadrinhos digitais, também conhecidas como webquadrinhos, englobam todas as produções de Histórias em Quadrinhos feitas de forma híbrida ou totalmente produzidas com suporte de programas de ilustração digital. Dentro desse contexto, e tendo em vista a trajetória das Histórias em Quadrinhos brasileiras, é perceptível que estas possuem uma forte relação com o crescente fluxo de informação no mercado, e, que também foram e são impulsionadas pelos meios de comunicação digitais em espaços virtuais como as redes sociais. O presente estudo apresenta o objetivo de identificar como as dinâmicas informacionais presentes na rede social Instagram podem ter transformado o paradigma da Visualidade das histórias em quadrinhos independentes no Brasil. Metodologicamente, o trabalho pode ser considerado como exploratório, que se utiliza da pesquisa bibliográfica e documental, da análise diacrônica, da análise de conteúdo e da observação sistemática de grupos alvos, quadrinistas brasileiros, sobretudo os independentes que publicam webquadrinhos, os quais demonstram indícios de mudança em sua abordagem e Visualidade. E, em específico para o conceito construído e defendido neste trabalho, uma Visualidade de um quadrinho que “parece coisa do Brasil”, percebe-se que este é fruto desse contexto criado em ambientes virtuais das redes sociais, e das dinâmicas informacionais que ali ocorrem. Somente a partir da observação e da identificação de tais ciclos informacionais foi possível elaborar reflexões que sustentem um juízo de valor em torno do conceito de “parece coisa do Brasil” nas HQs nacionais independentes.
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